A viagem que não fiz…

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Uma vez, na faculdade, uma professora contou que ela e o marido tinham viajado para Salvador e ele, para fazer uma surpresa, a levou em uma viagem a Santo Amaro da Purificação, no Recôncavo Baiano, terra de Dona Canô, mãe de Caetano Veloso e Maria Bethânia (e outros seis filhos).

Achei o máximo e, desde então, fiquei com isso na cabeça. Um dia faria essa mesma viagem. Pesquisei ônibus de Salvador para lá, horários, preços, tinha tudo anotado certinho para quando fosse colocar em prática.

Mas não me contentaria apenas em conhecer a cidade. Bateria na porta da casa dela (já tinha fuçado a internet e encontrado o endereço) e, no meu “fantástico mundo de Bob”, ela iria atender, claro, e eu entraria para comer uns biscoitinhos e bater um papo.

Certeza que Dona Canô seria uma simpatia. Mas enfim… O tempo passou, eu não fui e, em 2012, ela faleceu aos 105 anos em um dia de Natal.

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"Passei o dia e a noite pensando em minha mãe. O dia de Natal passou a ser também o dia em que ela morreu. Nunca imaginei que fosse achar tão difícil aceitar que ela tenha morrido. Era uma grande alegria tê-la viva. Claro que alegra também saber que ela viveu bonito por tanto tempo e morreu bonito num 25 de dezembro. Mas o mundo tem me parecido, desde então, muito pior. Infelizmente não sei rezar como ela chegou a saber. Talvez tenha aprendido (principalmente com ela) que reconhecer a beleza da vida é uma maneira de rezar. Hoje, no dia de Natal, sinto como é difícil reencontrar a beleza. Não temos, no entanto – e muito menos eu que sou filho dela – o direito de abandonar a festa. A festa de tudo o que há, que é o que significa o jeito como ela habitou este mundo. Ela pôde dizer que a ideia de um Natal feliz resiste a toda tristeza. O mais justo com sua memória é acertar a ser feliz", @CaetanoVeloso . #CaetanoVeloso #Caetano #DonaCanô

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Fiquei arrasada! Era uma das pessoas que eu mais gostaria de ter conhecido! Pelo que já vi em documentários e na TV, me lembrava muito minhas avós, mulheres muito simples, religiosas e sábias.

Dona Canô, ou Claudionor Viana Telles Veloso, era considerada um patrimônio da cidade.

A celebração de seus 100 anos, em 2007, foi um verdadeiro evento e, ao invés de presentes, ela pediu que as pessoas doassem alimentos ou itens de higiene que seriam encaminhados a instituições carentes.

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Segundo matéria do jornal Tribuna da Bahia, publicada na ocasião de seu falecimento, Dona Canô passava as férias na infância e parte da adolescência na casa grande de um engenho, onde recebeu boa formação cultural, desenvolvendo sua sensibilidade para as artes – talento que transmitiu para os filhos, amém!

Foi ela quem percebeu, mais tarde, que seu Caetano levava jeito para a música, antes mesmo que ele se desse conta desse dom.

E depois, quando ele já era adolescente, ela sempre o chamava para ver quando Gilberto Gil – “aquele preto que você gosta”- aparecia na TV em programas locais. Como não amar essa mulher? ❤️

Na cidade de Santo Amaro da Purificação Dona Canô sempre se envolveu em mobilizações sociais e realização de festas, principalmente religiosas, como a tradicional lavagem da escadaria da Igreja Nossa Senhora da Purificação, com missa cantada por Maria Bethânia.

O evento entrou para o calendário oficial do Estado e a igreja (lá da primeira foto) é um dos principais pontos da cidade, que tem também museus (como do Recolhimento dos Humildes), construções tomabadas pelo patrimônio histórico (como o Solar de Subaé, atual Casa do Samba), além de cachoeiras e trilhas nas proximidades.

Mas a casa da Rua do Amparo continua sendo, para mim, o principal e mais belo ponto. Quem sabe ainda passo por lá um dia?

Para ler ouvindo:

(Crédito da foto principal: site da Prefeitura de Santo Amaro)

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