“Viajar expande a mente e o espírito”.
(A. C. Grayling, filósofo britânico)
Quando resolvi viajar com meus afilhados pela primeira vez, mais do que proporcionar momentos de lazer e diversão, o que eu queria era mostrar a eles o diferente. Outros sotaques, outras modas, outras cores de pele. É o que amo e aconselho a todos: sair do próprio mundo, perceber o quanto há além. Porque é assim que os julgamentos ficam pequenos e a empatia cresce.
Nem é preciso ir longe – com informação (real) e com leitura (e interpretação de texto) já seria possível adquirir essa visão mais ampla do mundo. Tem muita gente que nunca foi nem à cidade vizinha e é assim. Mas estar de verdade em um lugar potencializa tudo isso, traz questionamentos e reflexões. Transforma. A gente vê coisas que funcionam e deseja que por aqui seja assim também. Vê coisas que não funcionam e deseja que não aconteça. A gente vai vendo outras pessoas. Outros estilos de vida. Outros comportamentos. Vai observando diferentes realidades. Conversando. Ouvindo. A gente aprende, ou melhor, a gente vivencia história e cultura.
Ver lugares onde a igualdade de gêneros já é realidade, onde mães (e pais!) têm direito a uma licença maior no nascimento dos filhos, onde o racismo é combatido, onde há políticas sociais e de saúde funcionando, onde o estado é laico, onde museus fazem questão de lembrar o passado para que não se repita no presente, onde uma mulher viajando sozinha não é vista com espanto nem precisa ter medo do perigo… São só alguns exemplos de coisas que já são realidade em outros países e que muito podem nos ensinar sobre educação, respeito, altruísmo, tolerância e vida em sociedade.
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Viajar é privilégio e a gente precisa reconhecer isso
Tem um texto do Amir Klink que eu adoro que diz que “um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser; que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver”. Por isso eu sempre digo que quem viaja nunca volta igual!
Mas aí eu descobri que não é bem assim! Que tem gente que viaja e não absorve nada do que viu, que não fica com a cabeça mais aberta e que continua sendo um poço de pré-conceitos (ainda que, às vezes, camuflados). Gente que segue cheia de certezas. Que não reconhece sequer seus privilégios, que não consegue nem por um instante se colocar no lugar do outro. Que desdenha de lutas e causas que beneficiam tantos nos lugares por onde passou e poderiam beneficiar aqui também. Ou que quer usufruir de benefícios do 1° mundo, mas sem abrir mão de costumes e comportamentos que por lá não fazem sentido – e nem aqui deviam fazer!
Aliás, vem ler esse texto do Daniel Duclos do blog Ducs Amsterdam! O título é “Da relação entre limpar seu próprio banheiro e abrir sem medo um Mac Book no ônibus” e ele fala sobre conceitos e valores que permeiam as relações pessoais, profissionais e a igualdade social holandesa.
Aproveita e lê também esse da jornalista e doutora em Ciências Midiáticas e da Comunicação Ivana Ebel, publicado em seu blog Hoje tem textão: “O brasileiro acha chique visitar Paris, Roma, Berlim, mas a Europa é, em essência, tudo o que a classe média odeia”. É sobre brasileiros que vivem fora e fazem comparações quando voltam ao Brasil, mas criticam quando há alguma proposta de fazer aqui o que existe em outros países.
Eu sinto um misto de tristeza, vergonha alheia, desesperança…
Claro que nem todo mundo absorve tudo da mesma maneira e o que um aprende não significa que o outro vá aprender também. Nossas visões de mundo têm muito a ver também com a formação que já temos e que nos leva a enxergar sob determinada ótica. Por isso mesmo são múltiplas. E, até aí, não há nada de errado. A diversidade de opiniões e pontos de vista é positiva e necessária.
O que eu lamento é ver gente que já teve e tem a oportunidade de rodar umas boas milhas mundo (ou Brasil) afora, adora posar de viajadíssimo nas redes sociais, mas continua se comportando como se não existisse território algum além do seu umbigo.
* Foto: Dariusz Sankowski/Pixabay
Esperamos que a oportunidade de observar outras culturas e novas realidades façam as pessoas aumentarem seu senso critico e empatia, valorizando todas as lutas realizadas e aprendendo com os erros cometidos, mas infelizmente alguns não absorvem nada, voltam até pior, só olhando o próprio umbigo e com as indignações seletivas, mas pagando de super viajado cidadão do mundo.Ranço é mesmo a palavra do momento.
Disse td Mari!!! To indignada com essas pessoas… já vou compartilhar obviamente! Bajo
Excelente texto, parabéns! As vezes penso comigo “o cara foi pra X países, viu um monte de situações que fazem qualquer um pensar (isto já é suficiente) e continua um zé mané” De fto, tem gente que não entende nada! 🙁
Excelente reflexão e triste constatação, Mari! Entender sobre história dos países dos quais se inspirar de fato ajuda a perceber que os processos são longos e por vezes doloridos.
Acho que aprender com viagens depende também da disposição da pessoa – e só aprende quem está aberto a vivenciar o diferente. Tem que estar com a mente e o coração abertos, senão a pessoa volta até pior…
Compartilho deste mesmo sentimento descrito no texto. É muito triste ver pessoas que posam de viajadas porque já tiveram a oportunidade de conhecer lugares tão diversos, especialmente outros países,mas quando voltam parecem realmente que não aprenderam nada. Esta eleição me mostrou que existem pessoas que tiveram a chance de ver outras culturas,realidades e isso não cria necessariamente uma relação diretamente proporcional com a capacidade de aceitar e desejar para si e para os outros um mundo mais plural, tolerante e democrática. Infelizmente tem gente que a viagem só serve mesmo pra fazer Selfie para ter estoque de foto de perfil na rede social.
Adorei o texto! Concordo tanto!
Andar de metro em NY eh cool mas ser ativo para que o transporte público no Brasil seja descente ninguém quer, só para dar mais um exemplo.
Maravilhosa sua reflexão. Apenas maravilhosa. Queria escrever um textão aqui para mostrar o quanto gostei, mas você já disse tudo que eu poderia dizer. Obrigada por compartilhar com a gente. (Obs: Amo as músicas que coloca após suas reflexões… Passei o dia ontem ouvindo Tom Jobim, depois da sua carta ao Rio)