“Um coração quente de amor por Bogotá” – por Vitória Cabral

“Eu sempre achei bem inspiradora a forma como a nossa geração lida tranquilamente com o ato de se viajar sozinho. Inclusive, sempre fui bastante independente no que diz respeito a ir sozinha para os lugares. Não é nem um pouco incomum para mim a ida ao cinema sozinha numa tarde de quarta-feira, nem o jantar em um festival de restaurante japonês, por exemplo. Mas viajar… Parecia uma experiência bem louca.

O engraçado é que eu sou meio inclinada a gostar das experiências loucas. Todas as vezes que eu me via presa em um escritório numa tarde ensolarada, eu pensava no tanto de coisas que eu poderia estar fazendo lá fora. No tanto de coisa que ainda não foi vista no mundo. Nessas horas sempre me dava uma sensação bem curiosa, chamo de “bichinho do viajante”. É um formigamento metafórico nos pés, uma vontade sem igual de largar tudo e sair andando sem rumo.

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Me apareceu a oportunidade de ir para a Colômbia nessa época. Sempre foi um país que estava bem lá no fundo da minha bucket list, porque sempre é bom conhecer lugares, mas nunca foi realmente uma prioridade. Não parecia ser tão legal quanto passar uma semana no Atacama, ou visitar o Malahide Castle na Irlanda. Mas oportunidade a gente não joga fora, né?

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Dessa forma, no dia 29 de novembro de 2016, eu esperava meu horário de embarque no Aeroporto Internacional de Guarulhos. Eu, uma mochila grande e um frio na barriga que não passava por nada, afinal era a minha primeira viagem sozinha, primeira viagem internacional, primeira vez que eu ficava frente a frente comigo mesma no estado mais puro possível.

Chegando em Bogotá descobri que os colombianos são muito gente boa. Eles são abertos, sabe? Não se importam de informar os estrangeiros, de falar mais devagar caso alguém não fale o idioma deles… Isso me conquistou de primeira. É bom saber que você, apesar de estar em um lugar completamente estranho e sem ninguém, está cercado de receptividade.

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Ao todo meu mochilão durou uma semana. Foi a semana mais louca da minha vida. Eu nunca dei tanto valor para comida caseira! Peguei uma gripe que me derrubou nos três primeiros dias e a comida era meio diferente demais. Emagreci 4kg. Fiquei desanimada, chorei igual criança porque ouvi a voz da minha mãe no telefone e pensei em adiantar a passagem e voltar logo. Até então, eu havia dado umas andadas pela cidade e conhecido alguns pontos turísticos típicos, como o centro histórico (a Candelária é absolutamente linda e, apesar dos noventa mil pombos, a Plaza Simon Bolívar é a cara da Colômbia e foi maravilhoso ver um lugar que até então eu só havia visto por fotos).

E aí eu fui no Monteserrate, o lugar mais alto de Bogotá. Não sou uma pessoa muito religiosa, mas aquele foi o ponto alto da minha viagem. Foi quando eu olhei Bogotá de cima e percebi que eu estava lá, comigo mesma, por mérito totalmente meu. Que eu estava realizando um sonho! Chorei igual criança de novo, mas dessa vez era um choro de alegria.

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O céu, naquele dia, era de um azul absoluto. Não havia quase nuvens no céu. Eu senti uma gratidão sem igual por tudo que eu havia me tornado. Eu percebi que tinha lidado com os meus defeitos mais chatos (insegurança e saudosismo excessivo) e agora estava lidando com a minha qualidade mais bonita: a gratidão. Eram três dias de viagem e eu havia lidado com pontos de mim que eu nunca tinha notado. Eu amadureci.

Nos dias que seguiram eu conheci a deliciosa Usaquén, um pueblo de Bogotá onde tem uma feirinha de rua maravilhosa aos domingos, e onde o almoço é uma aventura, já que existem vários restaurantes diferentes para escolher. No hostel conheci duas holandesas e juntas fomos a Zipaquirá. É um outro pueblo, onde tem uma catedral esculpida dentro de uma mina de sal. É de encher os olhos.

A Colômbia me surpreendeu em muitos sentidos. A comida passou a ser bem tranquila para mim e hoje é até algo que eu sinto falta. As pessoas hospitaleiras. A forma como os endereços são dispostos. A simpatia dos vendedores e taxistas. O gostinho do café e dos waflles. A cordialidade com que todos perguntavam do Brasil e se animavam com as histórias que eu tinha para contar.

viajando-sozinha-vitoria-cabral-boliviaEu voltei de Bogotá com o coração quente de amor por aquele lugar. Voltei sabendo como eu lido com os limites e situações complicadas. Voltei com histórias maravilhosas para contar. Voltei com a certeza de que viajar é a coisa que eu mais amo fazer.

No fim das contas, criei um blog para falar das minhas experiências de viagem, planejamento e inspiração para quem quer viajar e acha que isso é um bicho de sete cabeças: o Meninas de Mochila. Todas as vezes que me sento para escrever sobre as coisas que eu já vi por esse mundão afora, é como se eu fizesse uma nova viagem para cada lugar. Isso faz o coração vibrar de um jeito…

Aliás: viajar sozinha vicia, viu? Dia 26 de outubro de 2017 parti para mais uma expedição rumo ao Deserto do Atacama, por quinze dias. E aqui termino meu relato com a citação de um outro texto meu, que define exatamente o que é viajar, para mim: “Existem coisas na vida que só a estrada nos ensina. Invertem-se as prioridades, alguns valores e opiniões. É quando você aprende que sua vida pode caber numa mochila porque você não precisa de um monte de objetos para viver. É sobre ter a cabeça nas nuvens, os pés no chão e o coração como guia.”

Texto: Vitória Cabral 
Fotos: Arquivo Pessoal

Já viajou sozinha e quer ver seu relato publicado aqui?
Me escreve no mariana@marianaviaja.com

 

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