Como o coronavírus e a quarentena mudaram rotinas por todo o Brasil e pelo mundo

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Fosse um sábado qualquer eu estaria comendo bolo. Eu gostava de sair à tarde e, nos fins de semana, eu sempre me permitia açúcares e carboidratos. Agora me permito todo dia. Foi uma das mudanças da quarentena em função do coronavírus. Com idas raras ao mercado, passei a ter mais industrializados. E também porque comida gostosa faz bem pra alma e não é hora de ficar regrando – já estamos com tantas regras, flexibilizei a alimentação. Mas bolo não tenho e não dá pra ir assim só pra isso, só porque bateu vontade.

Faz pouco mais de um mês que aqui no Espírito Santo o governador decretou alguns fechamentos e deu a orientação de que a população saísse o mínimo possível. Eu já trabalhava de casa e, nesse sentido, não tive muitas alterações. Mas, exatamente por trabalhar de casa, eu tinha o costume de caminhar na praia de manhã e sair pelo menos para dar uma volta no fim do expediente, quando desligava o computador. Por isso mesmo fazia compras pequenas, assim sempre tinha motivo para sair. Esta foi a principal mudança, além das medidas constantes de higiene e os cuidados mais atentos (à distância) com meus pais.

Fora isso, os altos e baixos, sobre os quais já falei no texto Um dia de cada vez – solidão em tempos de pandemia. Preocupações, tensões, a sensação de aprisionamento, o medo, o não saber até quando. E tudo intensificado por ver que muita gente (muita gente!!!), tanto aqui em Vila Velha como em outros lugares, segue levando normalmente suas vidas, o que me faz às vezes pensar que só eu estou nessa angústia. Mas sei que não. E conversar com outras pessoas sobre isso tem me feito bem. Assim, convidei amigos produtores de conteúdo de viagem que moram em diferentes locais do Brasil e do mundo para que cada um contasse como está a rotina na quarentena. O que mudou na vida, no trabalho e até mesmo em relação ao blog. Veja aqui algumas histórias!

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No Brasil

São Paulo (SP) – por Thaís Carneiro, do blog Mulheres Viajantes

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Imagem de Joel Fotos por Pixabay

“Estou desde 16 de março dentro de casa. O governador decretou que serviços não essenciais fossem fechados. Restaurantes só com delivery, apenas mercados, farmácias, bancos e lotéricas funcionando. Em algumas praças e outros lugares onde havia pessoas desrespeitando as medidas a polícia colocou tapumes para ninguém ocupar o espaço.

A adaptação é esquisita. Não saio de casa e, quando saio, tenho medo. Tem tido pessoas jogando água e objetos pela janela, mandando os outros para casa. É uma dificuldade de conviver em sociedade, porque não tem como julgar o que cada um está fazendo na rua.

Passei a comprar muita coisa online, até para apoiar também empreendimentos menores. E temos todos os cuidados de deixar sapato na porta, tirar a roupa, tomar banho, higienizar tudo com sabão e água ou álcool em gel. Agora na rua estamos usando máscaras também.

Fica uma sensação de: quando vai acabar? Socorro! Sinto falta de tudo. Sair na rua, andar, ir a lugares que eu frequentava. Vários estabelecimentos pequenos faliram. O centro tinha passado por uma transformação nos últimos cinco anos, agora vai voltar a ser morto, com poucos lugares para frequentar.

Tinha uma viagem em abril para uma cidade aqui perto e desmarquei. Outros planos de viagem cancelei também. Não só por não poder transitar, mas porque financeiramente não é mais viável, já que parte da renda foi cortada.

E no blog mudei o conteúdo para não ficar falando de viagem ou incentivando a viagem para fazer quando tudo isso terminar. Porque o mundo não vai ser o mesmo. Então esse incentivo exacerbado não funciona, não é realista. Quis fazer conteúdo contando um pouco das angústias, transformações, e tenho falado mais de coisas que podemos fazer em casa e de formas de adaptar o turismo para experiências online. Mais no sentido de viver o hoje do que sei lá daqui quantos meses. Quando tudo acabar, a gente não sabe quem vai sobreviver, quem vai ter dinheiro. E acho que a gente tem de pensar no desenvolvimento local .”

Rio de Janeiro (RJ) – por Klécia Cassemiro, do blog Fui Ser Viajante

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Imagem de chulhwan yoon por Pixabay

“Minha quarentena começou dia 12 de março da forma mais assustadora possível: sintomas de febre alta e tosse, que me afastaram do trabalho por 14 dias. Não evoluiu para nada mais grave, mas foram dias de tensão. E não consegui fazer o teste para Covid, porque meus sintomas eram leves estavam controlando apenas para os mais graves.

Depois que passou, voltei a trabalhar. Trabalho no laboratório de um hospital, faço plantão em média três vezes na semana. A rotina mudou completamente. Fico insegura pra pegar transporte público, por isso estou indo de carro, mas esse não é um privilégio que todo funcionário de saúde tem. Tenho colegas em trens cheios e outros que não podem vir porque não têm carros e as viagens intermunicipais de ônibus foram interrompidas.

Passo 12h de plantão de máscara. Para ir ao banheiro é toda uma dinâmica de tirar a paramentação sem se contaminar. E não podemos mais tomar café ou almoçar todos na copa. Saindo do hospital, a rotina muda completamente também. Dirigir pelas ruas vazias é muito estranho, um pouco angustiante e assustador. Ao mesmo tempo, quando saio e vejo mais gente, também fico angustiada imaginando que estão quebrando a quarentena. Ao chegar em casa, vou direto para o banho antes de falar com meu marido. Lavo roupas que vieram do hospital todo dia. E tudo que vem da rua leva um banho de água e sabão ou álcool.

Adaptar a isso é difícil. Tenho saudades de coisas simples, como andar de bicicleta no aterro ou ficar conversando na calçada de um bar perto de casa. Tem dias que tenho medo, tem dias que falta esperança. Pra controlar, tenho me jogado nos trabalhos de casa, cozinhando coisas diferentes do básico (o que quase nunca fazia na vida normal), falando com meus pais e amigos, e até tentando aprender bordado e aquarela. De certa forma, a quarentena foi uma forma de ressignificar minha casa e meu tempo também. Para criar um abrigo.

Também tento manter uma rotina de exercícios nos dias que estou em casa. São coisas que parecem simples, mas que têm uma função muito importante: me deixar longe da tv e do celular. Evito noticias como uma forma de preservar minha sanidade. Cada um está tentando achar uma forma de sobreviver a isso, a minha está sendo criar um universo de paz e esperança dentro da minha casa. Como um santuário onde o corona não tem vez.

Nas redes sociais tento compartilhar exatamente isso: minha forma de resistir, com calma e com alma. Não consegui escrever no blog sobre esses sentimentos, mas quero. Espero que consiga, mas não estou me cobrando. Para isso nem para nada. E rezo para que a gente passe por isso com o mínimo possível de perdas de vidas. E para que o depois chegue. Não sei exatamente o que vem com ele, mas espero que estejamos todos lá pra descobrir e viver.”

Recife (Pernambuco) – por Carol Duque, do blog Idas e Vindas

“Sou dentista e no dia 13 de março veio o decreto de que eu não poderia mais atender meus pacientes. Assim comecei minha quarentena. No início o distanciamento social aqui chegou a 70%, mas foi ficando mais relaxado. Em alguns lugares não respeitam aglomerações, o comércio está aberto, como se nada estivesse acontecendo.

Eu dei férias para minha funcionária do consultório, fechei tudo, dispensei pacientes – só posso atender urgência e só consegui uma vez. Mas financeiramente ficou complicado, pois mantenho as salas, tenho gastos e não tenho ganhos.

E é entediante ficar dentro de casa. Nas primeiras semanas fiz várias coisas do blog, arrumei coisas na casa. Fico alternando dias mais tranquilas, outros irritada, angustiada, em alguns só durmo, outros mais criativa e animada. Oscilando muito. Uma sensação de que estou perdendo tempo, a vida está acontecendo, eu cheia de planos e estou trancada.

Estou com minha mãe que é idosa e grupo de risco. Então quando saio fica mais intensa a preocupação, tenho de estar ciente que na volta tenho de tomar banho, desinfetar tudo que trouxe do mercado e colocando sapato do lado de fora de casa. Também estou preocupada com a doença matando tanta gente, inclusive profissionais de saúde, que é minha área. E saber que não vai passar nem tão cedo, que a gente não vai poder se comportar da mesma forma daqui pra frente.

Sinto muita falta de ir para a praia, nadar, estar em contato com a água. Não poder estar nem perto me faz muito mal. E também de estar com minha família, meus sobrinhos. Cancelei uma viagem que faria para Fernando de Noronha, mas ainda não tive resposta de ressarcimento, é outro problema para resolver. E no blog estou regularizando posts e vídeos que tinha pendentes, conseguindo ser produtiva, isso tem me ajudado a ficar mais leve. Música também me ajuda, vídeos, séries, fico lendo algumas coisas, fiz curso online de fotografia. Se não tivesse isso eu estaria enlouquecida dentro de casa.”

Boa Vista (Roraima) – por Jordana Cavalcante, do blog Jô Viajou

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Imagem de Ederson Brito – MTUR

“Aqui em Roraima a quarentena foi decretada no dia 17 de março. O governador fechou escolas, depois outros órgãos públicos e comércios. Logo de início houve um grande impacto na economia, eu mesma fui afastada do meu trabalho no dia 18. Por ser uma cidade/estado pequenos, o governo ao longo desse um mês acabou mudando o decreto várias vezes. E nós já temos muitos problemas fronteiriços, questões de imigração, então o coronavírus foi mais uma bomba, mais um desafio pra gente entrar em crise e se reinventar.

Minha rotina mudou totalmente. Sinto falta da liberdade! É estranho porque eu tinha hora de acordar, sair, voltar, ver amigos, família. E é uma sensação de reflexão, de pensar em muitas coisas. Você até pode sair, mas se limita por medo de pegar e passar para familiares – no meu caso, estou com meus pais que têm mais de 60 anos.

No ano passado fui a Amsterdã e visitei a casa Anne Frank. Fico pensando que ela ficou lá, anos, com a família, em um lugar bem pequeno, estreito, cheio de limitações. Foi algo bem triste e fico pensando nessa família sem poder sair nem na esquina… Isso tudo faz a gente refletir nosso momento, nossa vida, o que a gente faz no dia a dia. Mexe muito com nosso emocional, tudo o que se passa no mundo até dentro da nossa casa. Mas, de certa forma, estou tendo mais trabalho, porque faço muita coisa online, seja no blog ou em estudos. Estou me dedicando mais, porque minha cabeça está livre de outras responsabilidades externas.

E sinto falta de viajar. Cancelei muitas viagens que tinha marcadas até julho. Solicitei reembolso porque não sei se depois vou conseguir remarcar, não sei o prazo ou quando vou poder fazer isso. E meu conteúdo do blog também mudou bastante. Já faço um trabalho voltado para mulheres viajantes, então peço dicas do que estão fazendo em casa ou do que querem saber e vou produzindo em cima das demandas. Tenho falado mais de entretenimento como filmes, livros, coisas para fazer em casa, mercados para delivery e também auxílio em relação a cancelamentos de viagem. É uma forma de contribuir com a sociedade.”

Campos (RJ) – por Aline Dias Pinheiro, do blog Vem que te conto!

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Por Vladimir H. Ribeiro – CC BY-SA 3.0, Hiperligação

“Comecei a quarentena há pouco mais de um mês. No início parece simples, mas ficar o tempo todo dentro de casa nem sempre é fácil. Estou conciliando meu trabalho, os estudos da minha filha e tentando fazer tudo funcionar da melhor forma. Também auxilio minha mãe fazendo as compras do mercado – ela é idosa e mora na mesma cidade, mas em outra casa.

Às vezes é difícil manter a sanidade e continuar saudável tendo de lidar com tudo isso e com as muitas notícias que chegam o tempo todo. Fico apreensiva em relação ao futuro, como vai ser o novo, de tudo isso desencadear alguma ansiedade. Mas meio que compreendi que esta é a nova realidade, então estou tentando não sentir falta de nada.

Tento manter uma rotina, acho importante principalmente para crianças. Mas deixo sempre espaço para atividades leves, leituras (vários sites estão disponibilizando livros online gratuitamente), filmes, brincadeiras. Estou aproveitando possibilidades que a internet oferece. A alimentação também entra na rotina, com horários certos.

Mas, como não sei quanto tempo vamos ficar em casa, estou sempre buscando flexibilizar. Principalmente para não ser muito rígida com minha filha. Acho que o mais importante não é ficar pensando em metas e produtividade, mas sim evitar o estresse.

Quanto às viagens, eu já tinha decidido que em 2020 iria apenas para destinos mais próximos e que não precisasse fazer um planejamento antecipado. Nos feriados de Páscoa e de Tiradentes seria assim, mas acabou que com a pandemia nenhuma delas aconteceu.

E em relação ao blog eu também já tinha decidido que iria publicar menos este ano. Agora então, se não é o momento de viajar, não tem porque falar em viagens. Então tenho feito textos mais pessoais, às vezes publico, outras vezes não. Nos stories tenho postado dicas de inglês e outras coisas do nosso dia a dia também.”

Cumuruxatiba (Bahia) – por Olívia Souza Cruz, do blog Olívia garimpando por aí

“Moro no Rio de Janeiro e passei o verão todo em Cumuruxatiba, lugar que adoro e venho sempre que posso. Voltei para casa depois do Carnaval para retomar minha vida, mas logo meus compromissos foram cancelados. Como meu apartamento no Rio fica em um lugar muito movimentado e sabendo que eventualmente eu precisaria sair, decidi voltar para cá e foi a melhor coisa que fiz.

Vim no dia 18 de março e três dias depois a Bahia decretou o fechamento em todas as cidades. Aqui não chegam mais ônibus vindo de outros lugares e tem vigilância na entrada, estão fazendo bloqueio. Por ser um lugar pequeno, com apenas um posto de saúde, a médica daqui pede para as pessoas não circularem por localidades próximas. E a cidade obedeceu! Por mais que não tenha nenhum caso, tudo continua fechado (lojas, barracas da praia) e você não vê gente na rua, aglomeração. É interessante ver que em uma cidade grande as pessoas têm um comportamento muito mais egoísta. Já aqui as pessoas se mostram mais unidas nessa quarentena. Me sinto mais protegida realmente.

Estou feliz aqui, mas minha vida mudou. Estou na casa de um casal de amigos queridos, não sei quando volto para o meu apartamento. Tinha compromissos e coisas alinhadas para este ano, tive de cancelar tudo. Reagendei viagens que tinha, mas nem sei quando poderão realmente se concretizar. É uma coisa muito louca.

Tenho tentado manter uma rotina de trabalho, continuar escrevendo, estudando (aproveitando os cursos gratuitos na internet). Estou de frente para a praia, que está deserta, então consigo caminhar. Mas bate uma ansiedade e uma aflição de não saber até quando vai ser assim. Mesmo otimista acho que é um processo lento. Sei que o mundo realmente nunca mais será igual e não tem de ser mesmo! A gente tratava o mundo de uma maneira muito desrespeitosa, sem comprometimento, talvez a gente precise respeitar mais o planeta.”

Curitiba (PR) – por Aline Kamiji, do blog Latitude Infinita

“Começamos a quarentena no final de março, quando tudo em Curitiba começou a se fechar e a viagem que tínhamos programada foi cancelada. Permanecemos em casa, sem sair de jeito nenhum, apenas pra ir até o mercado. Os cuidados são extremos, máscara, papel na mão, roupa de fora e roupa de casa. Lavar as mãos quase como indo pra uma cirurgia e, claro, lavar todas as embalagens vindas de fora. Essa semana que começamos a ver mais pessoas na rua. Confesso que dá um certo desespero ao ver as pessoas despreocupadas.

Na produção de conteúdo de viagem, começamos a produzir vídeos de roteiros de sete dias. Para manter vídeos no canal e também para que após a quarentena aqueles que tenham postergado viagens usem como referência. A resposta pra esse vídeo foi boa, o nosso público gostou. No blog a atenção foi para a estrutura dos posts, arrumamos os SEOS, reescrevemos alguns. Produzir conteúdo novo mesmo, será a partir da semana que vem.

No Instagram criamos alguns quadros no stories com perguntas de lugares, curiosidades sobre os aeroportos e contos de furadas que os seguidores nos mandam. Tudo de forma descontraída, para servir de escape das notícias. Notícias que só olhamos no final do dia, para conseguirmos controlar a quantidade de informações tristes e pessimistas.

Além dos nosso blog, canal e Instagram, vendemos edições de vídeos e, para isso acontecer, nossa mente tem que estar bem. Trabalhar com criatividade nessa pandemia é difícil, mas conseguimos entregar todos os trabalhamos sem queda de qualidade. Falamos sempre que o momento não é de viajar, que quem puder deve ficar em casa. Precisamos ter saúde pra continuar sonhando.”

Na Europa

Portugal – por Ana Carolina, do blog Um olhar novo

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Imagem de bernswaelz por Pixabay

“Moro em Cascais, trabalho em uma universidade em Lisboa e faço passeios guiados. Meu último dia de trabalho presencial foi 13 de março – e também o último dia de aula dos meus filhos. Nesta data alguns espaços foram fechados. As orientações foram de trabalho remoto em situações possíveis. E, para compras no mercado ou farmácia, apenas uma pessoa da família poderia sair. Em locais como restaurantes, indicaram manter uma distância entre clientes, higiene, e máscaras nos prestadores de serviço. Mas a maior parte das pessoas já passou a não frequentar lugar nenhum. Então muitos foram obrigados a fechar.

Como meu marido está no Brasil, fiquei só eu com meus dois filhos adolescentes e sou a única responsável tanto para sair como para estar com eles em casa. Mas, por incrível que pareça, a adaptação deles foi mais fácil que a minha. Eu estava muito angustiada, com medo de ficar doente e eles ficarem sozinhos. Fui me tranquilizando, mas, depois, a falta de sair, de estar em contato com outras pessoas, começou a ser mais angustiante.

Criamos em casa uma não-rotina, coloquei metas para que eles cumprissem, fazemos aulas de inglês online em horários diferentes, estamos levando de forma melhor, tentando tomar um pouco de sol mesmo dentro de casa, pra não ficar com a imunidade baixa. Mas, ainda assim, é um pouco complicado em alguns momentos. Agora as aulas deles já voltaram. Eu sigo trabalhando de casa. Com isso ganhei cerca de 2h do meu dia, consegui fazer exercícios com lives de professores que eu gostava no Brasil, tem sido uma coisa agradável para mim.

Mas uma parte bem sofrida emocionalmente foi o cancelamento de uma viagem que tínhamos marcada para estarmos com minha família no Espírito Santo. Isso me causou muita tristeza e desconforto. Fiquei irritada. Mas não daria para ir, porque eu teria de ficar em quarentena e não poderia estar com meus avós, por exemplo.

E passei vários dias sem vontade de postar nada no blog ou nas redes. Acho que blog de viagem é algo muito positivo, tem a ver com realização de sonhos… Eu pensava: o que escrever para alegrar ou estimular alguém neste momento em que tenho de falar para não sair de casa? Nos últimos dias tenho feito algumas postagens com a preocupação de dizer que não são imagens de agora e tentado levar uma mensagem positiva ou de como estou me sentindo. Nos stories tento ter mais responsabilidade social, com ideias que possam ajudar alguém, ajudar pequenos empreendedores que conheço e quero que continuem seus negócios e possam crescer.”

Inglaterra – por Lívia Bergo, do blog Malas pra que te quero

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Imagem: Malas pra que te quero

“Acho que a quarentena aqui começou tarde demais. A gente já tinha casos no país, casos dramáticos na Itália e outros países próximos, mas o governo não tomou nenhuma decisão. Minha cidade, Cheltenham, tem um evento grande no início de março, com pessoas de vários lugares, e não cancelaram. Mas, apesar do governo ter demorado e pensado muito no lado econômico, quando começaram as ações não voltaram atrás. Houve bom senso. Na 3ª semana de março veio uma posição oficial mais rígida, com lockdown, empresas fechadas, se adaptando ao home office, orientação para não ter aglomerações, parques fechados, só serviços essenciais funcionando.

Hoje as pessoas só podem sair para compras e um tipo de exercício por dia, mas de forma que estejam em deslocamento. Não podemos sair à toa ou em grupo. E isso é aplicado a todas as cidades do país, sem discussão.  Os cuidados de higiene também mudaram, ninguém tinha costume de lavar tanto as mãos, lavar as compras, limpar mais a casa e ter álcool gel na bolsa.

Como já trabalho com home office há anos, minha adaptação foi mais psicológica que prática. Porque uma coisa é não sair porque tem muito trabalho ou não está a fim. Outra é estar proibida. Mas tenho consciência de que é preciso priorizar nosso bem estar. Então passei a me cobrar menos produtividade e focar mais na saúde mental. Me permito acordar mais tarde, comprei violão e jogos de tabuleiro para ter diversão em casa. Flexibilizei.

Mas sinto falta do cinema, que eu ia toda semana; da dança, que sempre fiz, mas que é algo que não volta tão cedo (tenho feito online); e de poder sair e ficar um longo período na rua, andar, parar, tirar fotos, tomar um café. Pretendia viajar no meu aniversário em abril e ir para o Brasil no fim de maio, o que não vai acontecer. E uma coisa difícil é que agora aqui é primavera. O inverno foi longo, muito frio, e a gente tem a expectativa de que quando a primavera chegar vai fazer vários passeios. Ver os dias lindos, sem chuva, e não poder sair, impacta psicologicamente.

Quanto ao conteúdo que produzo, não me cobro. A gente já não consegue lidar com todas as questões – medo do futuro, imprevistos de saúde ou financeiro – e ainda ter a rotina perfeita. Nas redes tenho tentado pensar em lives para gerar entretenimento para quem está em quarentena. Mas nada sobre viagens, porque as pessoas não vão usar essas informações agora, ou pior: ficarão lembrando do que estão perdendo. Eu prefiro não ser mais uma estimulando isso.  Temos uma responsabilidade como comunicadores de incentivar as pessoas a tomarem atitudes saudáveis e em prol do coletivo. Tento focar mais nisso.”

França – por Diana Figueiredo, do blog Diana Viaja

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Imagem de Sadnos por Pixabay

“Aqui em Paris a quarentena começou oficialmente no dia 17 de março, mas eu já tinha desmarcado uma viagem para o Brasil que seria de 10 a 15 de março. Moro sozinha e trabalho de casa, então a rotina não mudou muito. Mas no dia 20 comecei a sentir todos os sintomas de coronavírus. Dores no corpo, tosse, falta de ar, febre, perda de apetite e olfato.

Foram altos e baixos durante uns 20 dias em março e abril. Sozinha. Eu ficava pensando que, se eu morresse, a minha família estava distante e nem poderia pegar um avião e vir para cá. Então não foi só a questão física, mas psicologicamente a doença também me derrubou.

Mantive os cuidados de higiene e fiquei isolada em casa. Me forçava a tomar um pouco de sol na janela e a comer. Tive o apoio de ótimas médicas que foram um pouco psicólogas também, porque é um estresse grande.

Só depois que tudo passou é que contei para as pessoas. No Instagram continuei postando fotos. O Diana Viaja é meu ‘happy place’, não meu muro de lamentações. Mas depois resolvi compartilhar lá também, até como uma forma de mostrar para as pessoas que é importante ficar em casa e levar a sério a prevenção.”

Alemanha – por Edson Amorina, do blog Ligado em Viagens

“Moro em Ettlingen, no estado de Baden-Württemberg. Aqui a quarentena começou no meio de março com a orientação de fechamento do comércio e lugares de lazer (cinema, teatro), e de evitar eventos com mais pessoas.

Minha cidade é pequena, teve poucos casos registrados. Então a gente só tem os cuidados básicos de higiene e distanciamento físico das pessoas. A Viviane, minha esposa, continua trabalhando fora. Ela vai e volta de bicicleta e fica sozinha em uma sala, mas pelo menos sai de casa. Eu fico com a Olívia, nossa filha. Ela está sem aula e sem outras atividades que fazia, como natação e aula de piano. Foi tudo cancelado.

Como ela não está no ensino regular, não tem um home schooling muito definido, a professora manda por carta as lições e passo para ela. Mas não dá para manter o mesmo ritmo de uma escola e é complicado também manter uma rotina de trabalho, porque tenho de dar atenção para a Olívia, dar aula, não podemos sair com ela para lugar nenhum, temos que entreter dentro de casa. Fiquei desmotivado com o conteúdo do blog e redes, só consegui publicar um texto de uma viagem do ano passado.

Sinto falta da normalidade, porque a gente sai preocupado, volta preocupado, as conversas com pessoas que a gente gosta é sempre com preocupações. A cabeça está bem pesada. Olívia está triste porque perdeu o contato com os amiguinhos. A Vivi também ficou muito pra baixo com a situação como um todo. E eu tive umas crises hipocondríacas, toda hora achava que estava doente, peguei uns resfriados fortes, mas não me afetou tanto psicologicamente.

E em relação aos planos que tínhamos, foram muitas mudanças. Cancelamos as viagens que faríamos este ano – para a Romênia e para o sul da Itália. Vamos tentar fazer de novo ano que vem. E ainda não sei se vamos para o Brasil no fim do ano.”

No meio de uma viagem

Por Aline Rodrigues, do blog Uma Sul Americana

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Quito, Equador – Imagem de DEZALB por Pixabay

“Depois de mais de um ano mochilando pela América do Sul, estava em Atahualpa, no Equador, quando estourou a questão do coronavírus. Decidi ir pra Quito, capital, pra esperar mais informações. Assim que cheguei à cidade fui assaltada com uso de faca de carne pra me ameaçar. Levaram documento, cartões e meu celular. Foi bem tenso estar ali ainda digerindo o assalto, cheia de coisas pra resolver e ainda estar preocupada com uma pandemia.

No dia seguinte, 17 de março, já estava todo o país sob quarentena. Era proibido sair da cidade. Todas as estradas tinham bloqueios policiais e só passava quem tinha salvo conduto. O meu emitido pela embaixada, só me dava permissão para ir de Quito ao aeroporto. Também era proibido transitar na rua por motivos fúteis –qualquer um que não se encaixasse em comprar alimentos e medicamentos.

No dia em que fui à embaixada a polícia me parou pra questionar aonde eu iria. Apenas negócios desses mercados estavam abertos. Nenhum outro tipo de estabelecimento estava permitido funcionar. Sair à rua sem luvas ou máscara era infração com multa e, na terceira vez, prisão de até um ano. E para ir ao mercado, por exemplo, era apenas uma pessoa por família e te higienizavam inteiro! Houve uma ameaça de rodízio de documento, permitindo a cada cidadão a sair apenas um dia na semana conforme seu número de identidade.

Me sentia de verdade em um filme apocalíptico. Era impossível acreditar numa capital vazia e silenciosa. Todos os dias eu acordava e gritava na janela “bom dia, Quito” e ouvia o eco me responder. Os faróis abertos sem ter carro pra passar! Apenas táxis circulavam.

Foram 15 dias nessa agonia. Enquanto isso a embaixada estava tentando conseguir um voo de repatriação. Éramos 160 brasileiros em todo o Equador. Até que conseguiram pela primeira vez na história do Itamaraty o fretamento de um voo comercial. O voo foi humanitário e isso significa que ninguém precisou pagar pela passagem. Eu e mais dois mochileiros só voltamos por causa dessa gratuidade, porque viajamos sem dinheiro!

Agora faz estou em São Paulo, aproveitando esse tempo pra me dedicar ao blog e escrever os posts pendentes de meses. Apesar de ter hoje apenas 1/3 do acesso de antes do coronavírus, esses artigos vão ser lidos depois! Já meu Instagram, perdi o acesso no roubo e ainda estou tentando recuperar! Nem pude compartilhar esses dias de desespero, a repatriação, nada! Em casa tenho aproveitado pra me exercitar e criar projetos pra os quais geralmente não tenho tempo.”

Foto principal: Vila Velha – por Vitor Jubini/MTur

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