Jane Jacobs, espaços caminháveis e mulheres que viajam

jane-jacobs-espacos-caminhaveis-mulheres-seguranca

“As cidades têm condições de oferecer algo a todos apenas porque, e apanas quando, são cidades para todos”.

A frase é da escritora, jornalista e ativista social norte-americana Jane Jacobs (1916-2006),que sempre defendeu o resgate das ruas como espaço público, valorizando os pedestres e fazendo com que as cidades fossem mais saudáveis.

Seu livro, “Morte e vida das grandes cidades”, publicado no início da década de 1960, é, ainda hoje, uma referência para analisar os fenômenos urbanos e tornar as cidades melhores focado na perspectiva humana.

Para mulheres que viajam sozinhas, tudo isso impacta diretamente na questão da segurança, que é um dos fatores mais apontados quando se fala nesse tipo de viagem, além de ser um problema cotidiano da maioria das pessoas.

Leia também:
O turismo é o colonialismo moderno
Dicas para ser um viajante melhor e mais responsável

Quem foi Jane Jacobs?

Nascida em um pequeno povoado na Pensilvânia, ela se mudou para Nova York na juventude, durante o período da Grande Depressão (década de 1930), fascinada pelas muitas possibilidades e oportunidades que a cidade oferecia, além do estilo vibrante e multicultural.

Foi lá que começou a se interessar pelas questões urbanas, criticando situações que, na época, eram vistas como sinônimo de “modernização”, como a supervalorização dos carros particulares, os prédios cada vez mais altos, os subúrbios cada vez mais distantes e separados dos grandes centros.

Para ela, o modernismo crescia na mesma medida em que a decadência da cidade. Enquanto locais mais modernos tinham muita sujeira e violência, nos bairros mais tradicionais moradores e comércio conviviam harmonicamente a qualidade de vida era maior.

Formada em Ciências Políticas e Economia, enfrentou inúmeros desafios e foi uma voz de resistência, lutando pelo que acreditava: uma rua segura é a que tem mistura de usos (residencial e comercial), pessoas e movimento constantes, quadras não tão grandes e construções com vista para as calçadas, para que muitos olhos a protejam.

O olhar feminino de Jane é outro ponto que sempre fez a diferença nas ideias que defendia. Afinal, locais com mais pedestres aumentam a qualidade de vida no geral, o que é positivo para os moradores, e se tornam muito mais seguros, especialmente para crianças e mulheres, o que é importante também para as mulheres que viajam.

Leia também:
Mulheres pioneiras em diferentes áreas

Caminhada Jane’s Walk

Inspirado em Jane Jacobs, em 2007 foi criado o projeto Jane’s Walk, que promove passeios a pé em vários destinos em todo o mundo e vem se expandindo cada vez mais, sendo realizado inclusive em algumas capitais brasileiras.

Esses passeios são conduzidos por voluntários uma vez ao ano, sempre no primeiro fim de semana de maio, para coincidir com a data de nascimento da ativista.

O objetivo é ocupar os espaços públicos, abordando pontos como a história e cultura local, além de promover conversas e reflexões sobre a relação dos pedestres com a cidade.

Leia também:
O medo não é viajar sozinha, é ser mulher

Espaços caminháveis e segurança para mulheres

A pesquisa “Percepções sobre segurança das mulheres nos deslocamentos pela cidade”, divulgada em outubro de 2021, apontou que 96% das mulheres evitam passar por locais que são mais desertos ou escuros.

Os números mostram que o gênero ainda é um fator de vulnerabilidade nos deslocamentos urbanos, o que acaba reduzindo a participação feminina na vida pública e no lazer. E que também impede que muitas passem a viajar sozinha ou mesmo que saiam sozinhas nas próprias cidades.

O tema também é abordado no livro “Cidade Feminista – A luta pelo espaço em um mundo desenhado por homens”, da geógrafa canadense Leslie Kern, que mostra como uma geografia de exclusão real e material faz com que as mulheres encontrem entraves no ambiente urbano, com situações que reforçam papéis de gênero e subjugam corpos femininos.

O livro faz ainda um recorte de de raça, classe, sexualidade e capacidade para pensar as desigualdades urbanas.

São pontos que nós, mulheres precisamos pensar. Especialmente as que viajam ou pretendem viajar sozinhas, as que gostam ou precisam circular sozinhas pelas cidades onde moram. Mais que ocupar espaços, precisamos entender que os espaços sempre foram e ainda são construídos por uma sociedade patriarcal, de forma a gerar uma segregação – muitas vezes sem que a gente perceba.

Mudar tudo isso é urgente para que possamos criar diferentes futuros urbanos, sem desigualdade, violência e privação. Para todos e todas e todes.

Foto principal: Phil Stanziola, Public domain, via Wikimedia Commons

Conheça meu novo livro de crônicas "Nem louca, nem coitadinha, nem tão corajosa assim" e entre em contato por email (contato@marianaviaja.com) ou instagram (@marianaviaja) para adquirir o seu.